Pesquisadoras Do Butantan Comprovam Pela Primeira Vez Que Serpente Amazônica Se Alimenta De Aves

“Eu já sabia que, eventualmente, alguém iria documentar a ingestão de aves por Corallus batesii. Parabéns por terem sido os primeiros”, escreveu ele.

Serpentes do gênero Corallus são arborícolas e vivem a maior parte do tempo no topo das árvores das florestas tropicais. São animais oportunistas, que se alimentam de lagartos, pássaros e pequenos mamíferos que passam por elas.

A presença de aves na dieta dessas cobras já havia sido registrada para quase todas as espécies do gênero – com exceção da C. batesii e C. caninus, que habitam a floresta amazônica. A suspeita, no entanto, existia há décadas na ciência. Suas próprias características físicas são ideais para capturar presas volumosas, com dentes finos curvados para trás e cabeça avantajada. Inclusive, por serem morfologicamente muito parecidas, ambas eram consideradas da mesma espécie até a revalidação de C. batesii por Henderson e colaboradores em 2009.

A história da descoberta de Circe e Silvia teve início em fevereiro de 2023, quando o Museu Biológico do Butantan recebeu uma C. batesii, resgatada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) – a propósito, também fazia parte desta entrega a famosa víbora azul batizada de Rita Lee e agora exposta no museu. A serpente-papagaio passou por quarentena para receber cuidados veterinários, como todos os animais resgatados e encaminhados ao Museu Biológico. Nos primeiros meses, algo chamou a atenção das biólogas.

“A serpente ficou dois meses sem se alimentar e, ao defecar, notamos a presença de penas nas fezes. Isso demonstra como a observação do material biológico do animal e a atenção podem ajudar a obter respostas sobre sua biologia”, afirma Silvia.

As cientistas coletaram o material e o conservaram em álcool 70%. Três ornitólogos (especialistas em aves) foram consultados, mas não foi possível identificar a espécie da ave ingerida devido à degradação provocada pela digestão.

O estudo sugere que a ingestão da ave ocorreu na natureza, antes do animal ser capturado ilegalmente. O transporte e a manutenção inadequados, comuns durante a captura ilegal da vida selvagem, podem causar desidratação e estresse no animal, o que neste caso atrasou o processo de defecação e explica o grau de degradação das penas.

Para Circe e Silvia, além da satisfação da descoberta, foi emocionante receber o contato de um pesquisador que é referência para elas. “Foi uma surpresa muito boa. Nosso papel como cientistas é gerar conhecimento, e o que me fascina é que estamos sempre aprendendo. Saber que contribuímos para o conhecimento científico é muito gratificante”, destaca Circe.