Ancestral Das Plantas Recebeu Genes De Fungos E Bactérias

Genes importantes para o mecanismo de crescimento e divisão celular das plantas parecem ter migrado a partir de outros grupos de seres vivos, sem relação de ancestralidade. Os fragmentos de DNA teriam sido adquiridos de forma desconhecida por algas carófitas, o grupo de algas verdes que deu origem às plantas terrestres. Uma pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) revelou os organismos doadores, conforme relatado em artigo publicado no final de fevereiro na revista científica New Phytologist.

A pista sobre a apropriação de genes de fora da linhagem direta apareceu de forma acidental: enquanto investigavam as sequências genéticas de enzimas que degradam carboidratos nas paredes celulares vegetais, pesquisadores se deram conta de que elas surgiram repentinamente no caminho evolutivo – algas carófitas possuíam os genes, mas outras algas aparentadas, não. “Como a chance de eles terem aparecido ao acaso, por mutações aleatórias, é mínima, decidimos então buscar em espécies mais distantes”, conta o geneticista Luiz Eduardo Del Bem, da UFMG.

A equipe então obteve os dados genéticos de todas as espécies de seres vivos que não fossem plantas disponíveis no banco de genomas do Centro Nacional de Informação Biotecnológica (NCBI), dos Estados Unidos. Depois de meses de procura e comparação, encontraram os mesmos genes que codificam as enzimas em algumas espécies de fungos e bactérias. O achado evidencia o fenômeno biológico conhecido como transferência horizontal de genes.

Outro resultado que chamou a atenção do grupo mineiro é que, ao longo do tempo e da evolução das linhagens de plantas, os genes adquiridos por transferência sofreram uma série de duplicações e uma mudança radical no papel de suas enzimas. Originalmente responsáveis pela digestão de carboidratos, hoje essas enzimas atuam na remodelação da parede celular das plantas durante a replicação das células e na proteção contra fungos e patógenos.

Como a parede celular está envolvida diretamente no crescimento e suporte estrutural das plantas, seu surgimento foi essencial para a transição da vida na água para a do ambiente terrestre. Por essa razão, a aquisição genética vinda da troca entre microrganismos pode ter sido crítica para a evolução e diversidade biológica que conhecemos hoje.

A transferência horizontal de genes desafia a noção de que a vida evolui em formato de árvore, como postulava Charles Darwin, com características passando de uma geração à seguinte dentro de uma mesma linhagem. A transmissão entre grupos diferentes de organismos seria ilustrada com mais propriedade na forma de uma teia interconectada. Se até cerca de uma década atrás a troca de genes era vista como rara exceção, hoje se acumulam exemplos em espécies mais complexas e com parentesco mais distante.

Na maior parte das vezes, não se trata de uma transferência aleatória, por envolver algum contato entre os organismos fora do contexto reprodutivo. Diversos exemplos demonstram a troca de genes entre grupos de organismos diferentes, o que contribui para a variabilidade genética e o surgimento de novas funções.

O método utilizado pelos pesquisadores da UFMG permitiu calcular o momento mais provável da incorporação genética no DNA das algas carófitas, revelando que isso ocorreu entre 750 milhões e 550 milhões de anos atrás, durante o Pré-Cambriano. O ambiente terrestre nesse período pode ser imaginado como um cenário rochoso habitado por comunidades de microrganismos, o que facilitou as transferências genéticas.

Os mecanismos exatos de como o material genético foi transferido entre os organismos permanecem desconhecidos, mas envolvem formas conhecidas na natureza, como bactérias e vírus atuando como veículos dos fragmentos de DNA ou RNA. Essa descoberta é relevante para os estudos de evolução das plantas e evidencia a importância da transferência horizontal de genes na diversificação e adaptação das espécies.