Craque No Laboratório E No Futebol Biomédica Estuda Ação De Toxina Do Veneno Da Cascavel Contra O Câncer

Camila nasceu na Zona Leste de São Paulo, na região de Sapopemba, e aos 4 anos mudou-se para São Roque com a família. Sua mãe, que veio do Ceará, era dona de casa e não tinha graduação, mas sempre incentivou as filhas gêmeas a estudar. As duas frequentaram escola pública e concluíram o Ensino Médio em 2006. No ano seguinte, Camila ingressou em um curso técnico de informática em Sorocaba (SP), cidade vizinha.

A vida de Camila virou de cabeça para baixo em 2009, quando ela começou o curso de Biomedicina na Faculdade Mario Schenberg, em Cotia (SP). Ela atravessava diariamente três cidades: de manhã ia para o curso de informática em Sorocaba, à tarde voltava para casa em São Roque e à noite ia para a faculdade em Cotia, de ônibus. Cada trajeto durava cerca de uma hora e meia.

No primeiro ano da graduação, conseguiu um estágio no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP), onde realizou dois projetos de iniciação científica: um sobre uma estrutura intracelular durante o desenvolvimento embrionário do ouriço-do-mar e outro sobre um possível tratamento para câncer de pele. Mesmo morando em São Roque, passava manhã e tarde na USP, em São Paulo, ia para a faculdade e depois voltava para casa. “Eu praticamente só ficava em casa para dormir; era uma rotina extremamente cansativa. Foram cerca de quatro anos nesse ritmo”, conta.

A mudança em sua vida veio no último ano da faculdade, em 2013, quando foi convidada por uma professora, Tatiane Lima, para ser sua aluna de iniciação científica no Instituto Butantan. Nesse momento, Camila trabalhava na clínica de acupuntura de uma amiga.

“Falei para minha amiga sobre a oportunidade e disse que não sabia o que fazer. Ela perguntou o que meu coração queria. Eu respondi que meu coração queria a pesquisa”, conta.

Em seu trabalho de iniciação científica no Butantan, Camila teve contato com o estudo de venenos pela primeira vez. Entre 2013 e 2016, dedicou-se a um projeto que analisava o efeito anti-inflamatório da crotoxina sobre os neutrófilos, um tipo de célula de defesa, e continuou a pesquisa em um Programa de Aprimoramento Profissional. Durante o mestrado e o doutorado, pesquisou como a crotoxina interfere na função dos monócitos e macrófagos, outras células do sistema imunológico, e como isso pode auxiliar no combate ao câncer.

Seus esforços no mestrado resultaram em um artigo publicado recentemente em uma revista científica de alta relevância. Camila avaliou o efeito da toxina sobre os macrófagos de animais com tumor ascítico e quantificou as células do tumor e de defesa após o tratamento.

O estudo foi pioneiro ao avaliar a eficácia da crotoxina no tratamento de um tumor líquido. No doutorado, investigou o mecanismo de ação por trás desse efeito e identificou as proteínas envolvidas na resposta inflamatória e antitumoral.

Além disso, o estudo do mestrado teve destaque na mídia, o que ajudou Camila a superar seu medo de falar em público. Atualmente, trabalha como tecnologista de laboratório no Butantan, contribuindo com o estudo da crotoxina, auxiliando alunos e pesquisadores e sendo responsável pela sala de cultura de células.