Covid-19: mortalidade materna mais que dobra em 2021 e retorna aos níveis da década de 1980

Há três anos, o Brasil enfrentou o período mais crítico da pandemia da Covid-19, com crescimento nos casos de contágio e de óbitos em todas as regiões do país. Uma pesquisa inédita da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) revela que a taxa de mortalidade materna mais que dobrou em 2021 em comparação com os anos anteriores. De acordo com os dados divulgados na Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, esse aumento fez com que esse indicador atingisse um nível semelhante ao registrado na década de 1980, com 110 mortes maternas a cada 100 mil nascidos vivos.

A análise indica um aumento no número de mortes de mulheres grávidas e puérperas, mesmo levando em consideração o acréscimo de óbitos esperado devido à pandemia – ao todo, foram registradas 3 mil mortes em 2021. Esse indicador acompanhou um aumento de 39% na mortalidade geral durante o período.

As gestantes e puérperas, no entanto, apresentaram uma taxa de mortalidade superior à das mulheres não grávidas. Os dados demonstram que, em 2021, houve um excesso de mortes maternas 51,8% maior em comparação aos óbitos de mulheres não grávidas, considerando a tendência dos anos anteriores.

O impacto da crise sanitária se agravou principalmente no segundo ano da pandemia. De acordo com os dados, 60% das mortes maternas em 2021 foram atribuídas à Covid-19, enquanto em 2020 foram apenas 19%. O aumento na mortalidade materna em 2021 foi de 57% em relação a 2020 e de 83,7% em comparação à mortalidade geral no mesmo período.

O estudo analisou o crescimento no número de mortes de mulheres grávidas e puérperas em 2020 e 2021, comparando com dados de anos anteriores, bem como a mortalidade de mulheres não grávidas em idade fértil no mesmo período. Para isso, foram utilizados dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade e do Sistema de Informações da Vigilância Epidemiológica da Gripe.

A taxa de mortalidade materna de 2021 ultrapassa a meta de 70 mortes maternas a cada 100 mil nascidos vivos estabelecida pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. O indicador já estava acima da meta antes da pandemia, destacando-se alguns estados e municípios em situação mais crítica. Segundo o pesquisador Raphael Guimarães, coautor do estudo, após a pandemia, a mortalidade materna dobrou, colocando todo o país novamente nessa situação crítica.

A qualidade da assistência médica durante o pré-natal está diretamente ligada à mortalidade materna. Países com infraestrutura e acesso precários aos serviços de saúde apresentam taxas mais altas desse tipo de óbito. Para os pesquisadores, a sobrecarga nos hospitais durante a pandemia e a infraestrutura deficiente da saúde pública em diversas regiões do país podem ter contribuído para o aumento dessas mortes.

“A saúde materna foi um dos aspectos mais impactados pela pandemia”, conclui Guimarães. Agora, é necessário estudar os efeitos de longo prazo da pandemia na organização do sistema de saúde, que foi evidenciado pelo aumento na mortalidade materna. “É provável que o debate sobre as desigualdades na saúde se torne ainda mais evidente nos próximos anos”, finaliza.